terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Eu sou John Merrick

 
(Sobre o filme "O Homem Elefante". É que, quando dei por mim, eu estava lá na tela, quase ele em pessoa. Eu sou John Merrick. Duvidam? )


Que prazer rever você, meu amigo! Que gosto bom foi o de reencontrá-lo depois de tanto tempo!
Eu assisti ao filme “O Homem Elefante” quando tinha doze anos. Certamente quem saiu da sala de cinema foi uma menininha apavorada com o que havia visto. Uma menina chorosa por conta de um filme muito triste.
Ontem eu estive com o homem (que não tem nada de elefante) outra vez. E uma outra Karla sentou-se para assisti-lo. E descobri que sou John Merrick.
Nos primeiros minutos do filme, o suspense. Eu já não me recordava de quase nada. Acometeu-me a dúvida de ir com o filme até o final. Mas logo aquele olhar amedrontado e piedoso de Anthony Hopkins (que faz o papel de seu médico) convenceu-me a ficar: seria ele o descobridor do ser humano que existia por detrás daquela imagem horripilante.
Quanto mais se desenrolava o filme, mais impressionada eu ficava. Sobretudo pelo fato de que teria sido baseado em história real. Quem teria sido este homem?
Um ser humano composto de alma, coração e inteligência e sensibilidade inigualáveis! Um poeta, um bom filho, um artista, um sonhador.
John Merrick, permita-me ser você. Porque sonho coisas impossíveis, porque vejo a vida com este mesmo romantismo, porque não preciso de espelhos... Porque acredito que as pessoas têm os seus valores impregnados dentro de si e nem se dão conta disso preocupadas que estão em parecerem lindas externamente. Porque acredito no Romeu e na Julieta que há em cada um de nós.
Teria eu conhecido você, John Merrick, e passaríamos longos dias conversando sobre as reais belezas da vida: os perfumes, os rostos de nossas mães, as famílias que se formam, as torres das igrejas, as crianças... Mas nosso tempo não foi o mesmo e agora eu fico aqui, desprezível como você, convencendo a muito poucos de que a vida transcende ao que o homem de hoje julga ser belo.
Hoje deixo a sala do cinema (que hoje é a sala da minha casa) chorosa também. Mas porque emocionada. Invejo a todos os que compartilharam sua história.
O mundo evoluiu dos seus dias pra cá, mas trouxe consigo a enraizada discriminação do que não é igual. Nossos mendigos andam pelas ruas abandonados como se não fossem seres humanos como nós. Nossos idosos, à margem da sociedade como se não a tivessem construído. Nossos alunos abaixo da média (?) vão por aí colecionando repetências, evasões e desistências num currículo que poderia ser outro, bem diferente. E seguimos, com nossos espelhos, ricos, jovens e graduados. Não há espaço para homens elefantes entre nós.
John, eu jamais poria a cabeça no travesseiro para dormir. Mas sei que Deus recebeu seu abandono depois da festa, depois do melhor dia de sua vida.
Recebe de mim o respeito que dedico aos que sofrem hoje por não serem iguais a todo mundo. Eu não sou – graças a Deus! – igual a todo mundo. Eu sou John Merrick.

Um comentário:

  1. Q lindo seu txt Karla! Os outros Merricks que estão por aí ficarão orgulhosos! Bjão!

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